"O que a cegueira oferece à arte": explorando novas formas de apreciar o mundo artístico
Por Guia das Artes
Imagine explorar a arte de uma maneira completamente diferente: não apenas com os olhos, mas também com as mãos, ouvidos e até mesmo outros sentidos. É exatamente isso que Georgina Kleege, escritora cega e autora do livro More Than Meets the Eye - What Blindness Brings to Art (Além do Olhar - O Que a Cegueira Oferece à Arte), defende em seu trabalho. Ela propõe que a arte não seja apenas um privilégio visual, mas uma experiência multissensorial, acessível e enriquecedora para todos.
A história por trás da escultura "Nydia"
No Metropolitan Museum of Art, em Nova York, a escultura "Nydia, the Blind Flower Girl of Pompeii", de Randolph Rogers, tem sido uma porta de entrada para experiências táteis lideradas por Kleege. A escultura, inspirada no romance Os Últimos Dias de Pompeia (1834), captura o momento em que Nydia, uma jovem cega, guia duas pessoas para a segurança durante a erupção do Monte Vesúvio.
Embora Kleege nunca tenha visto a escultura com os olhos, ela explorou cada detalhe com as mãos. Durante o processo, ela descreveu a experiência de tocar o rosto da escultura, seus braços macios e os pés delicados como algo que despertava emoções profundas de cuidado e compaixão. Para ela, o toque revela muito mais do que a aparência: é um meio de se conectar com a intenção do artista e até com a história da obra.
A revolução multissensorial nos museus
Pesquisadoras como Alison Eardley e Rachel Huthinson, da University of Westminster, argumentam que museus e galerias podem se tornar experiências mais ricas ao integrar recursos como audiodescrição e estímulos táteis. Elas lideram o projeto The Sensational Museum, que busca transformar a experiência museológica em algo multissensorial, onde visitantes possam interagir com obras de diversas formas.
Um estudo de 2021 mostrou que visitantes que ouviram descrições detalhadas de obras lembravam-se mais delas do que aqueles que apenas as viram. Isso reforça a ideia de que o olhar guiado — seja por áudio, texto ou toque — pode enriquecer significativamente nossa compreensão da arte.
Uma nova forma de ativar a arte
Kleege gosta de dizer que tocar uma escultura é uma forma de “ativá-la”. Segundo ela, é como se a obra ganhasse vida ao interagir com o espectador. Essa abordagem desafia a ideia de que os museus são apenas lugares para observar e propõe um modelo em que visitantes possam realmente sentir a arte.
Ela também sugere que as descrições feitas por pessoas cegas são tão valiosas quanto as de quem enxerga. Afinal, cada interpretação é subjetiva e contribui para uma visão mais rica e completa da obra.
O futuro dos museus multissensoriais
Hannah Thompson, professora da Royal Holloway University of London, imagina museus onde visitantes possam tocar réplicas de esculturas, ouvir sons associados às obras e até sentir aromas relacionados ao contexto delas. Ela defende que essas experiências ampliariam o impacto emocional e intelectual da arte.
A arte que toca a todos
Essa nova perspectiva sobre o papel da arte e dos sentidos convida todos, independentemente de limitações visuais ou não, a mergulharem em experiências mais profundas e significativas. Se a audiodescrição já está disponível em muitos museus, por que não experimentar?
A história de Georgina Kleege com a escultura "Nydia" nos ensina que a arte é muito mais do que aquilo que vemos. É um encontro com o passado, com emoções e com a humanidade de quem a criou.
Explore a arte com novos olhos — ou com novas mãos.
Fonte: BBC News Brasil, por Monica Vasconcelos.