A 20ª Unifor Plástica: Simultaneidades – A Arte Com A Palavra parte do uso da palavra na arte produzida na região, a fim de explorar relações entre a arte moderna de vanguarda, o artesanato e as diversas manifestações contemporâneas.
Com curadoria de Denise Mattar e assistência de curadoria de Cecília Bedê, cerca de 25 artistas de diferentes gerações foram selecionados por meio de um mapeamento realizado com a colaboração de curadores como Bitu Cassundé, do Museu de Arte Contemporânea do Centro Dragão do Mar de Arte e Cultura. “Acho um projeto válido, pois somos carentes de espaços que possam abrir as portas para os artistas daqui. Essa possibilidade é interessante e ter uma curadora que vem de fora e visita os artistas, fazendo uma seleção dentro de um tema, é muito importante”, diz o artista Mario Sanders, que participa da exposição.
Na entrada, um painel com os nomes de todos os participantes nas edições anteriores está plotado na parede, oferecendo um panorama dos trânsitos culturais que foram estabelecidos através do projeto, que em suas primeiras edições funcionava como um salão, selecionando artistas por meio de editais. Reproduções dos cartazes e outros materiais gráficos também dão a dimensão da continuidade e relevância da Unifor Plástica para o fomento da arte contemporânea no Ceará.
“Há ao mesmo tempo um imaginário coletivo rico e mítico que permeia as obras dos artistas. O contato com o Ceará me fez compreender, por exemplo, o quanto a obra de Leonilson é cearense”, diz a curadora Denise Mattar. Podemos perceber que a linguagem simplificada para a construção de figuras nos bordados e a associação entre textos e imagens, praticada pelo artista da Geração 80, é, na verdade, uma ação comum na cultura cearense, fruto de uma experiência arraigada na vida social. Esses estilemas encontram reflexo na produção de diversos artistas atuantes na região, como Mario Sanders e Leo Ferreira.
“Tenho uma aproximação com bordados, costureiras, porque sou de Aquiraz, uma região praiana que é um polo de rendeiras. Isso faz parte da cultura das famílias. Cresci nesse universo, mas demorei a fazer um trabalho com essa linguagem, porque sempre quis estar ligado a uma linguagem mais cosmopolita. Criei uma fusão entre a minha prática com o desenho e o bordado, depois de dar um curso para bordadeiras que tinham dificuldade com o desenho”, diz Sanders.
O artista Francisco de Almeida recebeu uma sala especial, na qual suas gravuras de grandes dimensões são apresentadas junto a matrizes que ganham o estatuto de obra, recebendo novas intervenções de cor após a impressão. Xilogravuras, transferências e intervenções com spray são recursos utilizados para discutir um imaginário religioso que aparece em uma fusão de múltiplas referências, do barroco ao grafite. Almeida produz pequenas matrizes que são repetidas em diversos trabalhos de formas diferentes, ora como personagens que mudam o estatuto das narrativas de acordo com o contexto, ora como módulos que são reproduzidos formando massas de cores e imagens de atmosfera soturna e dramática.
No vídeo Na Medida Em Que Caminho (Ou Notas Sobre Um Nome), Haroldo Saboia registra o deslocamento de uma região de semiárido para a serra, em ritmo dilatado, com textos de reflexão existencial, inseridos como legendas. Histórias esquecidas e ficções também são parte da exposição nos trabalhos de Virgínia Pinho, que apresenta fotografias e áudios que narram histórias de pessoas com hanseníase, que nos anos 1940 foram isoladas em campos de concentração. Na pintura No Início Era O Verbo E No Fim O Mundo Sem Fim (2019), Julia Debasse cria um mapa ficcional que relaciona lendas e mitos da região, com muito bom humor.
Em tempos de essencialismos identitários no campo político e social, chama atenção que o projeto parta de um recorte local, para propor uma ideia de multiplicidade. “Temos uma situação inédita nas artes plásticas, na qual, ao mesmo tempo que existe uma intensa globalização, há uma valorização dos aspectos característicos das diferentes culturas”, diz a curadora Denise Mattar. “O Ceará é um estado que tem uma produção de arte contemporânea relativamente pequena, mas, em contrapartida, há uma coesão e uma comunicação entre os artistas muito maior do que a de São Paulo ou Rio.”