COMO A ECONOMIA IMPACTA O MERCADO DE ARTE: REFLEXÕES GLOBAIS E PARALELOS COM O BRASIL
Artigo adaptado pela redação iArremate, inspirado no texto de Olivia Gavoyannis, originalmente publicado na Artsy, com comentários de Vinicius Villela.
A ARTE COMO TERMÔMETRO ECONÔMICO TARDIO
Embora a arte muitas vezes seja percebida como um universo à parte, desconectado das engrenagens da economia, o mercado que a sustenta é profundamente sensível ao cenário macroeconômico. Como aponta Olivia Gavoyannis, em análise para a Artsy, ele gera empregos, movimenta produção e receita, mas também responde a fatores como taxas de juros, políticas comerciais e flutuações cambiais.
“A indústria [da arte] contribui para o emprego e produção, mas também é impactada por fatores como taxas de juros, políticas comerciais e flutuações cambiais.” — Olivia Gavoyannis, Artsy
Gavoyannis lembra que a reação do mercado é geralmente tardia: entre a criação de uma obra, sua exposição e eventual venda, há um intervalo que filtra choques imediatos, mas que pode amplificar efeitos de crises prolongadas.
Segundo Vinicius Villela, que há mais de uma década acompanha a digitalização e a análise de dados do setor, esse “atraso” cria espaço para inovações capazes de reduzir a distância entre artistas, galerias e colecionadores. “Não se trata de acelerar artificialmente o mercado”, diz, “mas de oferecer instrumentos para que ele reaja com mais precisão às mudanças externas.”
LIQUIDEZ, JUROS E COMPORTAMENTO DOS COLECIONADORES
O levantamento da Artsy mostra que, em ambientes de juros altos ou restrição de liquidez, o consumo de arte tende a cair — mesmo entre colecionadores de alta renda. Por outro lado, períodos de rápido aumento de patrimônio — como durante o boom das criptomoedas — podem inflacionar preços e acelerar negociações.
“Em ambientes de juros altos ou com restrições de liquidez, o consumo de arte diminui; já em períodos de criação de riqueza, observamos aumento de especulação e inflação de preços.” — Olivia Gavoyannis, Artsy
Para Villela, a confiança é o ativo invisível que mantém transações vivas em momentos de incerteza. A clareza sobre procedência, histórico e valor real de mercado das obras é determinante para sustentar liquidez, e iniciativas de registro e análise de dados vêm se consolidando como ferramentas essenciais para isso.
O RETRATO GLOBAL DE 2025
A pesquisa da Artsy revela que:
- 75% das galerias citam a incerteza econômica como seu maior desafio.
- 60% já registram mudança no comportamento de compra ou baixa na demanda.
- 57% ampliaram presença online como estratégia de mitigação.
- Apenas 7% dos colecionadores aumentaram suas aquisições em 2024; 30% se tornaram mais seletivos.
Esse avanço digital não é exclusivo do cenário global. No Brasil, plataformas já vinham integrando leilões presenciais e virtuais desde o início da última década, permitindo a ampliação do acesso e reduzindo a dependência de grandes centros culturais — um recurso que provou ser decisivo em períodos de retração.
PARALELOS COM O MERCADO DE ARTE BRASILEIRO
PESO ECONÔMICO DA CRIATIVIDADE
A Economia Criativa brasileira movimenta cerca de US$ 66,9 bilhões e emprega mais de 5,28 milhões de pessoas. A renda média de seus profissionais é quase três vezes superior à média nacional, mas a informalidade e a concentração regional limitam seu alcance.
FRAGILIDADES E RESILIÊNCIA
Com juros elevados, inflação e volatilidade cambial, o mercado brasileiro enfrenta barreiras adicionais. Em períodos de retração, a demanda por obras de alto valor diminui, mas o interesse pela produção regional e emergente tende a crescer. Villela observa que a integração entre experiências físicas e digitais amplia a circulação dessas obras, permitindo que encontrem novos públicos mesmo fora dos grandes eixos culturais.
A DIGITALIZAÇÃO COMO ESTRATÉGIA
Assim como globalmente, a presença digital deixou de ser opcional no Brasil. A última década mostrou que infraestrutura tecnológica e acesso a métricas confiáveis podem não apenas expandir o alcance das obras, mas também estabilizar negócios em ciclos econômicos adversos.
LIÇÕES E CAMINHOS POSSÍVEIS
A análise de Gavoyannis, combinada à experiência brasileira, sugere três direções estratégicas:
- Diversificação entre obras de artistas consolidados e emergentes, equilibrando liquidez e renovação de público.
- Transparência por meio de registros confiáveis, fortalecendo a confiança entre compradores e vendedores.
- Integração digital, permitindo que o mercado reaja de forma mais ágil a mudanças econômicas e amplie seu alcance geográfico.
Villela resume: “O mercado de arte cresce quando é confiável, acessível e conectado. A tecnologia não substitui a experiência da arte, mas garante que ela continue acontecendo, independentemente do cenário econômico.”