Uma galeria de arte com interfone na porta, mobiliário em madeira, piso de tábua corrida de peroba com jequitibá, cactos sobre o chão e sobre a mesa, plantas nas janelas, três gatos gaiatos, churrasqueira, gambiarra e rede na varanda. Uma casinha meio rosa, meio salmão por fora, no Jardim Botânico, com paredes brancas do lado de dentro, muitos pregos e muitos quadros pendurados, um quartinho da bagunça. Bem-vindo à Quadra.
— A sala ao lado é o caos. Mas é um caos de arte. A gente chama de salinha suja. O Bernardo (Bonilauri) pinta lá. Todo mundo quer conhecer — comenta a designer e curadora de arte Marcela Setton, de 24 anos.
Marcela e Bernardo, de 28, artista, tatuador e também designer, abriram as portas, com hora marcada, do híbrido de casa e galeria de arte no final do ano passado. Ele mora lá. Nas outras salas funcionam seu estúdio de tattoo e o ateliê de joias A Clandestina. No andar de baixo, um estúdio de música.
— Morar é a menor parte — diz.
Juntos escalaram um time de 18 artistas brasileiros como Guto Lacaz, Ana Freitas, Mateu Velasco, Gustavo Francesconi, Rafael Uzai e Laura Gorski, de Porto Alegre, São Paulo, Curitiba e Rio, dos 24 aos 80 anos, alguns renomados, outros principiantes. Puseram o site no ar, pregaram os quadros nas paredes e passaram a receber visitas.
— Percebemos que existia um gap muito grande entre uma pessoa comprar um pôster sem curadoria, sem ser assinado por um artista e entrar numa galeria para comprar uma obra de arte de valor. Muita gente que entra numa galeria não tem coragem de perguntar os preços. E quem cuida da venda, normalmente, é um agente e não o colecionador — observa Marcela.
— Estou te vendo com vários quadros lindos atrás — afirma Bernardo, enquanto conversa com a repórter. — Fizemos uma decoração mais intimista para que o cliente consiga se imaginar em casa. E nós também vamos até os apartamentos deles para dar consultoria na hora de escolher os quadros. É um serviço para quem está começando a pensar na decoração.
Ao todo, a Quadra têm 120 obras, sem contar com os múltiplos, entre canvas, pinturas óleo e acrílica, gravuras e fotografias. A proposta é que os valores sejam acessíveis — os preços que vão de R$ 200, para gravuras sem moldura, a R$ 5 mil.
— O high-low é uma coisa que as pessoas estão praticando em diversas faixas sociais. É legal você misturar uma coisa um pouco mais barata com outra mais cara. A vida é assim — defende Bernardo.
A seleção do acervo levou um ano para ficar pronta. Marcela e Bernardo bisbilhotaram nomes de artistas nas principais residências do Brasil, ficaram de olho nos candidatos ao Prêmio Pipa e aceitaram indicações.
— Primeiro, analisamos se o trabalho nos instiga. O segundo momento é se tem a ver com a nossa linha curatorial, se dialoga com os outros artistas que temos na casa. Depois, se é um trabalho consistente e tem continuidade. Nossos artistas não são exclusivos — explica Marcela. — Queremos trazê-los para mais perto do nosso público. Incentivamos os artistas a focar na produção, e a esquecer a parte de comercialização, logística, entrega.
Um dos hits cobiçados da galeria são os convites metalizados, rosa e azul, que a paulistana Flávia Junqueira, de 32, fez para uma exposição.
— São tíquetes de carrossel. Como a Quadra trabalha com obras pequenas a preços muito acessíveis, a venda tem um grande frescor — diz a artista, cujo trabalho é vendido por R$ 200.
Também no elenco da Quadra, Ana Freitas, de 36, faz uma reflexão sobre o tempo no projeto exibido na galeria.
— Quando fui convidada, achei muito interessante. Porque eles se posicionam de um jeito diferente no mercado — opina Ana. — Apresento uma série de fotogramas, em que criei uma imagem mental sobre o tempo, a partir de vários encontros com um físico.